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lara-bernardo.jpg

Paciência

Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede um pouco mais de alma
A vida não para

Enquanto o tempo acelera e pede pressa
Eu me recuso faço hora vou na valsa
A vida e tão rara

Enquanto todo mundo espera a cura do mal
E a loucura finge que isso tudo é normal
Eu finjo ter paciência
O mundo vai girando cada vez mais veloz
A gente espera do mundo e o mundo espera de nós

Um pouco mais de paciência
Será que é o tempo que lhe falta pra perceber
Será que temos esse tempo pra perder
E quem quer saber
A vida é tão rara (Tão rara)

Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Mesmo quando o corpo pede um pouco mais de alma
Eu sei, a vida não para (a vida não para não)

Será que é tempo que me falta pra perceber
Será que temos esse tempo pra perder
E quem quer saber
A vida é tão rara (tão rara)

Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede um pouco mais de alma
Eu sei,a vida não para (a vida não para não… a vida
não para)

Lenine e Dudu Falcão

Ouvi essa música pela primeira vez ao final da peça “Calendário da Pedra” da intensa e linda Denise Stoklos. A peça, que já tinha me tirado o sangue, ao final secou qualquer distração que inventa ser ao querer fugir. Ecoa no teatro, no palco, na cadeira e na folha de papel que eu segurava, ou segurava-me?

Tem tanto texto por aí falando da pressa, das pessoas correndo pelas ruas e metrô, dos olhares anestesiados… Mas olha bem, seu olhar está aí/aqui mesmo?

Mulheres todas: esse vídeo, para cada uma de nós.

Ficha Técnica: “Miedos”
Cliente: SAGA FALABELLA
Producto: SAGA
Motivo: MIEDOS
Agencia: LEO BURNETT
Director Creativo: JUAN CARLOS GÓMEZ DE LA TORRE
Redactores Creativos: J.C. Gómez de la Torre / Daniela Nicholson / Sandra Villareal
Casa Realizadora: FATFREEFILMS
Director: MILOVAN RADOVIC
Productor de Agencia: Daniel Ramírez-Gastón

Isadora Duncan conta que esse quadro foi uma das inspirações para sua dança, além do “desabrochar das flores, o vôo das abelhas e o dourado alegre e gratuito das laranjas e a papoula da Califórnia” (trecho do livro) e se definia como “uma expressionista da beleza.”.

A declaração de Isadora trouxe-me umas danças, umas danças dos anos idos de ballet, de moderno, de laboratórios aos 9 anos, de contato e improvisação, de afro, de salão… Tantas pernas e braços dançando, buscando um olhar que nasce no espelho, mas que só enxerga mesmo se nada tiver. O corpo que dói e grita, o suor que pinta a face rosada de se permitir só ser dançante.

Meu pai me disse hoje: “dançar faz parte do seu ser”, essa semana uma criatura bonita pensou em mim ao ler este poema:

Canção da Primavera

Primavera cruza o rio
Cruza o sonho que tu sonhas.
Na cidade adormecida
Primavera vem chegando.

Catavento enlouqueceu,
Ficou girando, girando
Em torno do catavento
Dancemos todos em bando.

Dancemos todos, dancemos,
Amadas, Mortos, Amigos,
Dancemos todos até
Não mais saber-se o motivo…

Até que as paineiras tenham
Por sobre os muros florido!

(Mario Quintana)

Parece-me que todos estão a dançar, quem fala, quem lê, quem toca, quem canta, quem silencia, quem chora e quem ri. O universo todo dança e gira continuamente, as infintas coreografias que improvisamos ao conhecer alguém, as danças que só existiram naquele instante, naquele corredor, naquela sala, naquela rua… E os aplausos que cessam e a cortina que cai. Todo o mundo dança 😉

Canção da tarde no campo

Caminho do campo verde
estrada depois de estrada.
Cerca de flores, palmeiras,
serra azul, água calada.

Eu ando sozinha
no meio do vale.
Mas a tarde é minha.

Meus pés vão pisando a terra
Que é a imagem da minha vida:
tão vazia, mas tão bela,
tão certa, mas tão perdida!

Eu ando sozinha
por cima de pedras.
Mas a tarde é minha.

Os meus passos no caminho
são como os passos da lua;
vou chegando, vai fugindo,
minha alma é a sombra da tua.

Eu ando sozinha
por dentro de bosques.
Mas a fonte é minha.

De tanto olhar para longe,
não vejo o que passa perto,
meu peito é puro deserto.
Subo monte, desço monte.

Eu ando sozinha
ao longo da noite.
Mas a estrela é minha.

Cecília Meireles

Li este poema no início do ano, bem lentamente. Na roda, as crianças embevecidas e eu, calamo-nos e o fim da tarde retumba.

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(foto)

A roupa que se estende no varal,
ainda úmida,
do cheiro de coisa limpa,
lembra os quintais da infância.

A roupa que tem cheiro de sol,
se estende na varanda do apartamento
ainda que apertado,
parece mesmo os varais erguidos com bambu.

Inaugurado o lençol,
inaugurada a toalha e a blusa.
Que me veste, que te veste.
E tudo cheira fundo de quintal.

wakinglife.gif

(cena de Waking Life)

Muitas vezes não sei dizer se uma lembrança foi sonho ou se “realmente” vivi aquilo. Algumas cenas me aparecem embaçadas, pouco nítidas e longínquas. Algumas vezes olho para algo e tenho a sensação de que tudo está tão pequeno, meu dedo, as letras do livro, o monitor…(não, não é sono!) Ou eu que pareço sair voando e estranho.

Mais um dia e saio pelas ruas de sonho, pego ônibus de sonho, dou e me dão beijos de sonho, olhos de sonho, sabores de sonho e tento lembrar e fica tudo bem longe, bem pequenino. Andei pelos mesmos lugares e parece tudo novo/velho…

Há vezes em que me estranho, não sei se acordei ou se ainda sonho.
Há vezes em que me conheço, mas não sei se quero acordar ou parar de sonhar.
Há vezes em que só estranho…

caminhar.jpg

Resta hoje e resta cada instante, resta eu, resta seu nome, resta a areia, resta a chuva, resta a vontade de chorar e o sorriso que não quer calar.

Poema preferido de uma garota que eu amo. Agora amo-o também… Leia bem devagar.

O Haver

Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
– Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido…

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história.

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e o mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de si mesmo e de sua força inútil.

Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Resta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Resta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
Pelo momento a vir, quando, apressada
Ela virá me entreabrir a porta como uma velha amante
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada…

Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens.

(Vinicius de Moraes)

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